Enquanto eu observava do fundo do corredor escuro o seu quarto iluminado,
ela chorava em silêncio a dor do seu próprio findar. Ela estava de costas
deitada sobre a cama e eu só via o soluçar do seu corpo, ritmado de samba
triste. Dói saber que o fim dela se aproxima e por isso verto lágrimas
também. Sei que ruas de ouro e jardins sempre floridos são o seu destino, mas a
perda nunca é fácil, mesmo quando um corredor flui entre nós e o desapego de
pensar nela todos os dias ou de ver o seu sorriso, já não existe. As paredes
sem tinta comprimiam o corredor e confinavam cada vez mais a minha visão.
Quando olhei à minha esquerda, entre outra porta no mesmo corredor, vi a
filha dela sentada num quarto onde a única luz vinha da janela que refletia lá
de fora a lua e os postes do pátio. Da mesma janela que emanava luz vinha uma
brisa fria que fazia bater as portadas das janelas e dançar o abacateiro,
fazendo música com as suas folhas. Eu sabia de onde era o som, mesmo sem ver o
abacateiro ou as portadas, porque outrora nenhum corredor de água nos
distanciava e o mesmo vendaval ou calor que elas sentiam, eu também sentia.
Porque antes, através das portadas de madeira abertas eu e sobre o chão frio,
observava entre os balaustres o vento no abacateiro. Só que agora já não estou
lá e um corredor flui entre nós. E a filha dela bordava ali sentada, com pouca
luz, uma colcha prata que, de tão grande, cobria as suas pernas e se estendia
pelo chão e cintilava com o brilho lá de fora. As paredes sem tinta comprimiam
o corredor e confinavam cada vez mais a minha visão.
Sei que ainda não chegou o fim. Mas que a paz carimbada no nome dela
brote no meio do pátio e germine nas raízes do abacateiro. E que, chegado o
fim, o adeus custe e doa como tem que ser. Mas que a paz carimbada no nome dela
brote, no meio do pátio e germine nas raízes do abacateiro e corra até as suas
folhas e de lá se expanda, por todos nós que por aqui ficamos.
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